sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O ensino superior que (não) temos


O Times Higher Education voltou a publicar a sua seriação anual das 400 melhores universidades do mundo, mais uma vez sem grandes surpresas: Harvard mantém o primeiro lugar que ocupa há já 4 anos; Cambridge regressa ao segundo lugar, perdido no ano passado para Yale, que desce à terceira posição; o University College de Londres mantém o ritmo de subida (25º em 2006, 9º em 2007, 7º em 2008), e atinge este ano a quarta posição; o Imperial College londrino e a Universidade de Oxford dividem a quinta posição, e são seguidas na seriação pela Universidade de Chicago, Princeton, MIT e CalTech.
Todas as dez universidades de topo são do mundo anglo-saxónico: seis norte-americanas e quatro britânicas. E as primeiras a escapar a este condicionalimo geográfico são, ainda assim, universidades anglófonas: a Australian National University (da Austrália, claro está) em 17º, e a McGill University (Canadá) em 18º.
Uma análise dos primeiros 100 classificados da seriação, mostra-nos que os EUA são, de longe, o país mais representado (32 menções), seguidos de Reino Unido (18), Austrália (8), Japão (6), Alemanha, Canadá, Holanda e Suíça (4 cada), Hong Kong (3), China, Coreia do Sul, Dinamarca, França, Irlanda, Singapura e Suécia (2 cada), Bélgica, Formosa e Nova Zelândia (1 cada).
No Top 400, o panorama não é muito diferente: os EUA lideram com 87 menções (quase 22% do total), seguidos de Reino Unido (47 - 12%), Alemanha (32 - 8%), Austrália (22 - 5,5%), Canadá e Japão (19 cada), França (17), Holanda (12), Coreia do Sul (11), Suécia e Suíça (8 cada), Bélgica e China (7 cada), Espanha, Formosa, Índia, Irlanda, Itália e Nova Zelândia (6 cada), Finlândia, Hong Kong e Malásia (5 cada), Áustria, Dinamarca, Israel e Noruega (4 cada), Brasil, Indonésia e Rússia (3 cada), África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Chile, Filipinas, México, Polónia, República Checa, Singapura e Tailândia (2 cada), e Emiratos Árabes Unidos, Grécia, Irão, Líbano, Paquistão, Portugal e Turquia (1 cada).
A primeira universidade europeia continental, que é simultaneamente a primeira universidade não-anglófona, é a ETH Zurich, da Suíça, que ocupa a 20ª posição ex-aequo com a Universidade de Edimburgo.
A Ásia coloca duas universidades japonesas no Top 25: Universidade de Tóquio em 22º e Universidade de Quioto em 25º.
O primeiro país da União Europeia (excepto Reino Unido) a surgir mencionado na lista é a França, com a École Normale Supérieure de Paris na 28ª posição. Aliás, o Reino Unido consegue colocar 47 universidades na lista, 29% de um total de 160 universidades da União Europeia aí classificadas. Se tivermos em conta apenas o número de menções na seriação, o ranking da UE será: 1º Reino Unido (47), 2º Alemanha (32), 3º França (17), 4º Holanda (12); 5º Suécia (8), 6º Bélgica (7), 7º Espanha, Irlanda e Itália (6 cada), 10º Finlândia (5), 11º Áustria e Dinamarca (4 cada), 13º Polónia e República Checa (2 cada), 15º Grécia e Portugal (1 cada).
A universidade lusófona melhor classificada é a Universidade de São Paulo (Brasil), em 207º lugar, ex-aequo com o University College de Cork (Irlanda). De resto, a lusofonia tem apenas 4 representantes no ranking: a já mencionada USP, a Universidade de Campinas (Brasil - 295º), Universidade de Coimbra (Portugal - 366º) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (Brasil - 383º). Na realidade, tantos quantos os do estado de Israel, com a agravante de as universidades israelitas estarem globalmente melhor colocadas na tabela (em 102º, 114º, 132º e 323º lugar).
À frente da academia conimbricense, a nossa única representante nacional, estão universidades dos EUA, Reino Unido, Austrália, Canadá, Suíça, Japão, Hong Kong, França, Singapura, Irlanda, Coreia do Sul, Holanda, China, Dinamarca, Alemanha, Nova Zelândia, Bélgica, Suécia, Formosa, Noruega, Israel, Finlândia, Áustria, Tailândia, África do Sul, Rússia, Índia, Espanha, Itália, Grécia, Malásia, México, Indonésia, Brasil, República Checa, Filipinas, Arábia Saudita, Chile, Argentina, Polónia, Paquistão, Líbano e Turquia. E a Universidade de Teerão (Irão) está em 368º lugar do ranking, apenas duas posições abaixo de Coimbra.
Uma análise às listas mostra-nos que o inglês é, nitidamente, o maior dos blocos linguísticos representados: 188 universidades (correspondente a 47% do total) dos EUA, Reino Unido, Canadá (excluindo 3 universidades francófonas), Austrália, Irlanda, Nova Zelândia, África do Sul e Singapura. Segue-se o alemão, com 41 representantes (10% do total) da Alemanha, Áustria e Suíça (excluindo 3 universidades francófonas). O francês é a terceira força linguística (26 universidades, 6,5% do total), com representantes de França, e ainda do Canadá, da Suíça e da Bélgica (com 3 universidades francófonas cada). Em quarta posição, nesta seriação linguística, surge o chinês/mandarim, que obtém 18 menções, oriundas da China, de Hong Kong e da Formosa. A quinta posição é ocupada pelo castelhano, com 12 universidades de Espanha, México, Argentina e Chile. Por fim, empatado com os países de língua árabe (Arábia Saudita, Emiratos Árabes Unidos e Líbano), surge o português, com 4 representantes do Brasil e de Portugal. Excluí desta análise outros grupos linguísticos que poderiam até ser mais representativos que o português, como o neerlandês/flamenco, por não ser consensual a sua delimitação.
Interessante é também uma eventual análise em função dos grandes grupos territoriais: verificamos que, não obstante a relativa má posição das universidades continentais no ranking, a Europa é a área com maior número de representantes (180, incluíndo a Turquia e Israel), à frente da América do Norte e Central (108), Ásia/Pacífico (102), e das regiões menos prósperas do globo (América do Sul, com 7 representantes, e África com 2).
Olhando para a lista, vêm-me à cabeça, assim de repente, algumas questões:

1) porque é que ainda há quem diga que Portugal tem universidades tão boas como as estrangeiras, se tem uma representatividade de 0,25% nesta seriação?
2) que políticas têm sido seguidas no sentido de colocar o ensino superior de língua portuguesa no lugar que merece (representatividade de 1%, na lista)?
3) Portugal e Brasil (e o resto do mundo lusófono) podem-se dar ao luxo de não desenvolver exponencialmente as parcerias universitárias, de maneira a fazer frente às nítidas carências de que sofrem, nesta área?
4) será que a má classificação das universidades da UE (excepto Reino Unido) está relacionada com o monolitismo e falta de adaptabilidade das instituições europeias?
5) não é suposto os professores ensinarem e os investigadores investigarem, ao invés de gerirem universidades? Para quando uma gestão profissional, privada e competente destas instituições?
6) as condições difíceis de Portugal e Brasil, a que muitos aludem, e certamente com toda a razão, serão piores que as do Líbano (em guerra civil até 1990 e envolvido em conflitos bélicos até há bem pouco tempo)?

Por fim, um conselho aos jovens que estão prestes a entrar no ensino superior português: se puderem, façam um favor a vocês próprios, e emigrem durante uns anos para o Reino Unido ou Suíça (caso não queiram ir para muito longe de Portugal), ou para os EUA, Canadá, Austrália ou Japão (se não vos fizerem muito transtorno as horas de voo). É que as diferenças entre Coimbra e Teerão não são muitas, aparentemente...

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Sim, podemos!



Era já a madrugada de 5 de Novembro de 2008 em Portugal, quando assistimos a este discurso. Mas nem as seis horas que nos separavam de Chicago conseguiam diluir a sensação de que algo estava a mudar no mundo.
Para quem, como eu, nasceu em meados da década de setenta do século XX, a mudança não era nada de novo. Assistimos ao fim da Guerra Fria e à queda do muro de Berlim. À abolição do apartheid e à libertação de Mandela. À emancipação de Timor Leste, e à ascensão do terrorismo fundamentalista a níveis nunca antes testemunhados.
A América que admirámos pelo progresso, no início do século XX, que olhámos sobranceiramente por entre os escombros das duas guerras mundiais, que nos dividiu na fidelidade quando o planeta se repartia entre democratas e comunistas, mas que nunca deixou de nos fascinar pela sua imensidão e pelo espírito indómito do seu povo, tinha-se tornado, até à fria noite de Novembro de 2008, o bode expiatório dos males do mundo. Mas tudo mudou.
Voltamos agora os olhos para o outro lado do Atlântico, com esperança e inveja, buscando ali as referências que não encontramos na multidão de burocratas que nos governam, em Lisboa e em Bruxelas. E, por uma vez, partilhamos com o povo americano a ousadia de ter esperança no que vem. Embora saibamos que, na melhor das hipóteses, as nossas eleições de 2009 vão ter como palavras de ordem um inócuo: sim, vamos ver o que se pode fazer...

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Por onde começar (ou "quem me levava ao altar")


Este blogue existe há meses. Juro! Procurei o melhor serviço, li imenso acerca das vantagens e desvantagens de cada um, e criei-o, com um título inusitadamente longo e difícil. Cheio de boas intenções, rascunhei por aqui um artigo inicial, definidor q.b. daquilo que se pretendia escrever nestas páginas, e suficientemente grave para arcar com a responsabilidade de ser o primeiro. Mas nunca me pareceu que bastasse, e o artigo, ou antes, meio-artigo, continua por ali a marinar, na vinha d'alhos das palavras pendentes.
A revelação veio hoje: o blogue não estaria, porventura, fadado a uma inauguração solene, de tomada de posse oficial. Seria à minha medida, sem pretensões de me transcender, de ser maior que o seu autor. Seria, apenas, o seu autor, com a sua dimensão e as suas fraquezas, mas também com o melhor que tenho para oferecer. E ocorreu-me que não fui feito para cerimonial de estado, mas sim para grande amores e paixões. Grandes, para a escala de um mundo que, na minha imaginação, ainda é suficientemente grande e misterioso para me encantar todos os dias.
Estava, pois, na altura de proclamar bem alto o meu amor que, não sendo único, tem a vantagem de ser o mais recente, e prometer estender-se até que a morte nos separe. Que me perdoe a R. Eu sei que ela nem vai entender, quanto mais perdoar... Mas que me perdoe esta indiscrição melómana, que toma um bocadinho do coração que lhe pertence. Apaixonei-me por uma outra bela mulher, de faces coradas e um certo jeito de menina, mas uma menina ponderada, que sabe e gosta de exibir a sua meninice.
Como se não bastasse este calculismo cativante, a moça padece de múltipla personalidade. Tanto a encontro gingona e deliciosamente arrogante, como se entrelaça em torno do meu corpo numa súplica sofrida. E o seu nome percorre-me os lábios como se de uma canção se tratasse: d-e-o-l-i-n-d-a.
Fica comigo, ao longo de todo o dia, retinindo nos meus pensamentos. Nunca esperei enamorar-me por uma Deolinda, confesso. Mas quantas mais vezes repito o seu nome, menos o estranho. Caramba, o nome é, por si só, uma declaração de admiração eterna! Faz-se amar, e desperta nos homens devoções.
Por mim, prometo continuar a amá-la em surdina, como se no meu peito houvesse espaço para um coração clandestino...